Kali Audio não é um nome conhecido dos audiófilos, mas sim dos que trabalham na área do áudio profissional. Com as LP-UNF, a marca norte-americana traz-nos um produto especificamente criado para uma nova geração de músicos e produtores, cuja "mesa de mistura" é um notebook em cima de uma secretária.
Numa sondagem recente que lançámos na nossa página do Facebook, perguntámos aos nossos seguidores qual a forma mais comum de ouvir música. Até podia não ser a preferida, mas sim a que acabavam por usar mais. Muitas pessoas indicaram que ouviam sobretudo música via streaming, através do seu PC.
Para dizer a verdade, é esse também o meu caso: no meu escritório, onde muita gente trabalha remotamente, fico frequentemente sozinho a trabalhar à tarde e gosto de usar colunas em vez de auscultadores para ouvir a minha música, via Spotify,
No entanto, ao longo de mais de 10 anos, nunca investi muito dinheiro em colunas de desktop (nunca mais de 100€), e limitei-me a ir usando o que tinha, trocando sobretudo por motivo de avaria ou, às vezes, com as dos meus filhos. Foi assim que ao longo de mais de 15 anos tive ao lado do meu monitor, e em cima da secretária, "colunas multimédia" da Creative Labs, Logitech, Edifier e, mais recentemente, uma monitoras profissionais, mas também de baixo preço, da Mackie.
Recentemente, decidi que queria fazer o upgrade para algo de mais substancial e descobri as Kali Audio LP-UNF – que chegaram na semana passada a Portugal, através do seu distribuidor exclusivo, a Supportview. E, só para que fique claro, esta é uma análise às minhas colunas. Ou seja, não foi um par emprestado pelo representante, mas sim colunas que comprei do meu bolso!
À distância de um braço
UNF significa "ultra near field" e, no caso das LP-UNF, designa um par de colunas ativas para ser colocado bem perto do utilizador: cerca de 80 cm, ou "à distância de um braço", como explica a Kali nesta ilustração que encontramos na folha de instruções (online):
A marca desenvolveu as LP-UNF especificamente com o propósito de oferecer capacidades superiores de monitorização para músicos que usam sobretudo o computador como ferramenta de composição e mistura, e a pensar também que serão sobretudo usadas em ambiente doméstico – um quarto, por exemplo – onde o espaço não abunda.
As melhores colunas monitoras para áudio profissional não são necessariamente as melhores para alta fidelidade, porque assumem uma série de pré-condições, ausentes da sala de um audiófilo. Em rigor, os monitores de estúdio não tentam soar “bem”: tentam soar o mais exato e preciso possível, o que não é necessariamente a mesma coisa! Os monitores de estúdio ideais devem revelar todos os detalhes da mistura, tanto os bons como os maus, e ao mesmo tempo reproduzir um equilíbrio exato em toda a gama de frequências.
Contudo, sou dos que gostam de um som neutro e "plano" – os meus auscultadores de eleição são os Ollo Audio S4X – pelo que achei que iria gostar de umas colunas também criadas com o mesmo objetivo. Quando, há uns meses, vi as novas LP-UNF no website da Kali Audio, fiquei entusiasmado e não descansei enquanto não as consegui comprar.
Instalação e primeiras impressões
As LP-UNF são um pouco maiores do que as maiores colunas desktop que usei até hoje (as Mackie CR3-X). Medem 25,4 cm de altura, 16,4 de largura e 18,6 de profundidade (na foto, o notebook usado como referência é um Thinkpad T480S de 14''). São totalmente construídas em matéria plástica (o habitual neste tipo de produtos) e só o painel traseiro é que é um retângulo perfeito, uma vez que "afunilam" ligeiramente à frente e, dos lados, são também um pouco abauladas.
As colunas têm uma unidade de médios/graves de longa excursão com 11,5 cm e um tweeter de material têxtil de 2,5 cm. Temos um pórtico frontal frontal para reforço de graves e ainda um controlo de volume tátil (com LEDs azuis, mas que podem ser desligados) na coluna esquerda (é possível reprogramá-las e forçar a troca de canais).
Estas colunas são ativas e bi-amplificadas através de dois amplificadores Classe D estéreo de 40 watts. Em termos de interfaces temos RCA, TRS (balanceadas), USB-C e Bluetooth (com aptX HD); ou seja, duas entradas analógicas e duas digitais. A fonte de alimentação é externa.
No painel traseiro encontramos um conjunto de DIP switches que permite alterar alguns parâmetros do som não apenas em função do gosto do utilizador, mas para compensar a forma como estas estão posicionadas – com ou sem parede por trás, em cima de suportes ou diretamente sobre a mesa, etc. Um cabo de quatro condutores faz a ligação entre a coluna esquerda (onde se encontra a eletrónica) e a direita.
Para este teste, usei a ligação USB-C ao meu computador (Windows 10), sendo que as colunas foram instantaneamente reconhecidas, sem necessidade de instalação de quaisquer drivers.
Excelente relação preço/qualidade
Vamos desde já esclarecer uma coisa: estas são colunas que custam mais de 3x mais do que as mais caras colunas multimédia que usei até hoje. E aqui coloca-se uma questão: uma vez que não sou músico profissional e que as irei usar para ouvir música de forma descontraída e não para audições mais analíticas, faz sentido gastar tanto dinheiro num par de colunas...?
Como em tudo na vida, a resposta depende da pessoa a quem perguntamos e, no meu caso, só posso dizer que sim – não só vale a pena, como são uma revelação total... embora não da forma que inicialmente imaginei. Diria que a principal características destas colunas é, efetivamente, a forma "correta" como reproduzem a música. No entanto, tive algumas surpresas agradáveis, a começar pela resposta de graves.
Isto porque, nas típicas colunas ditas "multimédia", a resposta de graves ou simplesmente não existe (dadas as reduzidas dimensões dos altifalantes e da caixa, bem como da tendência de usarmos volumes de som moderados) ou então surge de forma exagerada e/ou artificial, devido a processamento DSP.
Nenhuma dessas coisas é aparente nas LP-UNF. Não só a resposta dos graves é surpreendente face à dimensão do conjunto, mas é-o de forma natural. Mais: mesmo com volumes de reprodução muito baixos (porque, afinal, estou a trabalhar ao mesmo tempo!), os graves não se perdem tanto como seria de supor, algo que normalmente só se consegue através de controlos de "loudness" que retiram naturalidade à reprodução.
Ora, nada disso acontece aqui. O que temos é uma resposta sem esforço aparente na qual, se fecharmos os olhos, vamos imaginar colunas com pelo menos o dobro do tamanho. O palco sonoro é outra coisa que também impressiona, sobretudo se nos lembrarmos o quão perto as colunas estão dos nossos ouvidos: vídeos musicais via Youtube são especialmente reveladores, com a perceção do som a vir diretamente do centro do nosso ecrã.
Vou cometer uma heresia: mantendo a distância e a noção de que falamos de produtos completamente diferentes, a reprodução e, sobretudo, a resposta de graves das Kali Audio LP-UNF lembram-me umas colunas que ouvi pela primeira vez há mais de 15 anos, as B&W CM1. Que, à semelhança destas Kali, também eram (comparativamente) pequenas e tinham uma unidade de médios/graves de elevada extrusão.
Audições
Utilizei sobretudo três temas que me são muito familiares para avaliar a forma como estas Kali se comportam.
O primeiro foi Three O'Clock Blues, do álbum Riding With The King, de Eric Clapton e B. B. King. Trata-se de uma gravação "live in studio" – ou seja, toda a banda a tocar ao mesmo tempo, em vez de uma gravação pista-a-pista – em que o músico inglês surge colocado bem do lado esquerdo, enquanto o seu amigo norte-americano aparece claramente do lado direito... com o resto da banda no "meio da sala". *
A separação dos instrumentos, dos dois vocalistas e dos seus respetivos solos de guitarra é absolutamente perfeita, e nada fica a dever ao que estou habituado a ouvir no meu sistema doméstico de hi-fi, liberto dos constrangimentos com que aqui temos de lidar.
Rainbow, do álbum Build A Problem da britânica Dodie, que costumo ouvir em casa e tenho em LP, foi mais uma revelação. A reprodução dos vocais etéreos e cheios de "espaço" da cantora, bem como os arranjos de cordas, surgem quase sem compromissos, com as Kali a mostrarem uma vez mais que são capazes de se bater facilmente com colunas de maiores dimensões e, até, de gamas de preço muito superiores.
Finalmente, Peel Me A Grape, do meu álbum preferido de Diana Krall, Love Scenes, de 1997, é o tipo de tema que revela facilmente limitações em equipamentos de menor qualidade. É um arranjo do original do pianista e compositor norte-americano Dave Frishberg onde, além da voz da cantora canadiana surgem apenas três instrumentos: piano, contrabaixo e guitarra.
Uma vez mais, o espaço, os instrumentos e a voz de Diana Krall surgem separados e sem esforço, com as Kali a permitirem a correta identificação de cada instrumento no palco sonoro. Uma delícia que nunca achei ser possível desfrutar sentado à minha secretária.
Pontos negativos
Em rigor, só encontrei dois pontos menos positivos, e nenhum deles problemático. O primeiro é o controlo de volume. Para quem gosta de deixar os volumes no sistema operativo (Windows 10, neste caso) e da app de streaming (Spotify) no máximo e, depois, usar apenas o controlo de saída através da coluna, o volume ainda fica demasiado alto mesmo com o controlo nas colunas no mínimo dos mínimos.
Ou seja, apesar da boa granularidade deste sistema (há três níveis de brilho em cada um dos 11 LEDs do controlo digital na coluna esquerda), a atenuação não vai tão baixo quanto seria desejável e acabamos por ter mesmo de recorrer ao software do computador. Isto, porque a atenuação máxima que é possível realizar através da própria coluna é de apenas -30 dB.
Já o controlo das frequências através dos DIP Switches, embora seja eficiente – oferece diferenças de atenuação e ganho de gamas de frequências claramente audíveis – pode nalguns casos ser insuficiente para mitigar as idiossincrasias de salas de audição e/ou posicionamentos das colunas mais difíceis, embora tal não tenha sido o meu caso. Colunas de uma gama acima podem oferecer controlos mais sofisticados de equalização, até através de apps de dedicadas; no entanto, nesta gama de preços, o que é oferecido parece-me perfeitamente correto.
Dito isto, as LP-UNF valem o que custam? Não sei avaliar no contexto de uma utilização profissional (embora o consenso das reviews que tenho visto e lido por aí vá nesse sentido) mas, para a utilização que eu lhes dou, que é a de ouvir música enquanto trabalho, a resposta é "certamente que sim". Mais: excederam – e em muito – as minhas, já de si elevadas, expetativas.
Kali Audio LP-UNF: 359€ (par)
Disponíveis em: Supportview
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* Mas posso estar enganado e ter simplesmente sido gravado e produzido para soar dessa forma... :-)
